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Saiba quem são os assessores que ajudam ministros do STJ em suas decisões
O Superior Tribunal de Justiça convocou em outubro 93 juízes para que atuem nos dez gabinetes da 3ª Seção da corte. O objetivo é auxiliar na produção de decisões e votos.
Marcello Casal Jr/Agência BrasilFachada STJ
ConJur listou servidores que foram cedidos ao STJ para que atuem nos gabinetes dos ministros
Para além dos juízes, servidores de áreas diversas são cedidos ao tribunal para que atuem nos gabinetes, auxiliando os ministros na tomada de decisões: há na corte advogados públicos, procuradores da Fazenda e até delegados da Polícia Federal, cedidos a pedido dos próprios ministros.
Há, por exemplo, 19 procuradores nos gabinetes dos ministros, entre procuradores da Fazenda Nacional, procuradores federais, municipais e estaduais. Dois policiais federais também integram o gabinete do ministro Francisco Falcão, sendo um deles delegado.
Também foram cedidos dois militares, sendo um segundo-tenente do Quadro Auxiliar de Oficiais e um segundo-tenente do Quadro de Oficiais da Reserva; cinco advogados da União; dez analistas ou técnicos do MPU; seis defensores públicos; e diversos analistas e técnicos judiciários.
Em sua segunda edição, o Anuário da Justiça do Direito Empresarial 2024, publicação da revista eletrônica Consultor Jurídico, passou a publicar os integrantes dos gabinetes de Direito Privado e Direito Público, entre eles os que foram cedidos à corte.
Saiba quem atua em cada gabinete e quais seus cargos. A lista leva em conta servidores cedidos até 31 de agosto deste ano:
Francisco Falcão
Izabella Piuzana Mucida, delegada da Polícia Federal
Antonio Silva Nascimento, agente da Polícia Federal
Ângelo Márcio Alves de Souza, segundo-tenente do Quadro Auxiliar de Oficiais
Cecília Teixeira Azevedo e Silva, segundo-tenente do Quadro de Oficiais da Reserva
Mônica Cristina de Almeida Lima, procuradora da Fazenda Nacional
Hermes Santos Blumenthal de Moraes, advogado da União
Carlos Alberto do Carmo Reis, agente administrativo
Adriana Ardilha da Silva da Costa, analista judiciária
Jader Borges Guimarães, agente administrativo
Nancy Andrighi
Mariana Morschel da Costa, analista do MPU
Rafael Teixeira Coimbra, analista judiciário
Renato José Ramalho Alves, procurador estadual
Rodrigo Casimiro Reis, defensor público
Rodrigo Grando, oficial superior judiciário
João Otávio de Noronha
Adecleiton Bezerra, agente de educação/vigilância
Bruna de Oliveira Mende, analista de apoio à assistência judiciária
Bruno Pereira Costa, analista judiciário
Carla Vanessa Abreu do Lago Jardim, analista judiciária
Não membros da UE devem ser cautelosos quanto à diretiva sobre dever de diligência em sustentabilidade
Em julho de 2024, entrou em vigor a Diretiva 2024/1760 da União Europeia sobre o dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade (CSDDD). Após extensa deliberação sobre seu escopo, a versão final da diretiva restringiu sua aplicação a empresas de responsabilidade limitada constituídas na União Europeia (UE) que empreguem mais de 1.000 pessoas e gerem um volume de negócios líquido mundial de pelo menos 450 milhões de euros, bem como a empresas não pertencentes à UE que alcancem um faturamento líquido de 450 milhões de euros dentro da UE.
Divulgação
Essas empresas são obrigadas a identificar e mitigar os riscos e impactos negativos sobre os direitos humanos e o meio ambiente decorrentes de suas próprias operações, bem como das de suas subsidiárias e dos parceiros comerciais ao longo de suas cadeias de valor. Para tanto, devem implementar um plano de dever de diligência (due diligence).
Escopo da CSDDD
A diretiva impõe um dever de diligência a essas empresas para monitorar suas cadeias de valor globais. Será estabelecida uma Autoridade Nacional de Supervisão em cada Estado-membro da U.E. para supervisionar o cumprimento da Diretiva. Esta autoridade terá competência para realizar investigações e impor sanções às empresas que não cumpram as obrigações estabelecidas. Após a transposição para a legislação nacional pelos estados-membros, a diretiva permite que as empresas matrizes sejam responsabilizadas nos tribunais de seus países de origem por falhas em devida diligência que resultem em danos ambientais ou violações dos direitos humanos dentro de suas cadeias de valor. Consequentemente, as empresas matrizes podem ser responsabilizadas pelos danos causados por seus parceiros afiliados que operam em países terceiros.
Alcance extraterritorial da diretiva
A Diretiva CSDD desafia o princípio tradicional da personalidade jurídica separada e contorna a doutrina frequentemente invocada do forum non conveniens em casos que envolvem a responsabilidade das empresas por danos transnacionais aos direitos humanos ou ao meio ambiente decorrentes de atividades empresariais. Do ponto de vista daqueles afetados pelos danos dentro das cadeias de valor, a diretiva representa uma inovação significativa. No entanto, ela também carrega ramificações legais e políticas negativas para os países não membros da UE, especialmente para os países do Sul Global. Essas ramificações decorrem principalmente do alcance extraterritorial da diretiva, que impõe obrigações de conformidade às empresas, independentemente de sua localização geográfica.
Concentração jurisdicional nas mãos dos juízes nacionais dos estados da UE
O escopo extraterritorial da Diretiva CSDD pode prejudicar a autoridade jurisdicional dos tribunais nacionais dos estados não membros da UE onde empresas europeias estejam envolvidas em danos ambientais ou violações de direitos humanos. Essa situação ocorre porque a empresa matriz de um grupo multinacional pode ser processada perante os tribunais de estados-membros da UE, independentemente de onde o dano tenha ocorrido. Em muitos casos, processar a empresa matriz, em vez das subsidiárias locais ou dos parceiros comerciais, é uma decisão estratégica, pois a matriz geralmente possui mais recursos para atender às eventuais reparações.
Spacca
Por conseguinte, os potenciais demandantes, incluindo as vítimas, os seus representantes legais e, especialmente, as organizações não-governamentais, podem ser inclinados a direcionar suas ações contra a empresa matriz para garantir a compensação. Essa tendência pode levar a uma concentração de litígios nos tribunais dos estados-membros da UE, marginalizando assim a jurisdição dos tribunais nos países onde os danos ao meio ambiente ou às pessoas ocorreram originalmente.
Tal mudança de jurisdição levanta preocupações porque o quadro legal estabelecido pela Diretiva CSDD favorece desproporcionalmente os tribunais dos estados da UE, relegando os tribunais domésticos dos estados não membros a um papel secundário ou inexistente na resolução desses casos. Esse fenômeno não remete à lógica inerente à tradução do direito internacional privado, pois parece alinhar-se menos com o objetivo de harmonização jurídica entre jurisdições da U.E. e aqueles fora dela, mais com uma forma de imperialismo jurídico.
Estabelecimento de um padrão globalizado de dever de diligência corporativa
A Diretiva CSDD estabelece um padrão europeu de dever de diligência, que, devido ao seu alcance extraterritorial, terá um impacto global. Esse padrão será aplicado às cadeias de valor globais das empresas europeias, independentemente da localização geográfica de suas operações. De acordo com a diretiva, essas empresas podem negociar garantias contratuais com seus parceiros comerciais diretos e indiretos, exigindo que eles cumpram os planos de diligência das empresas de acordo com as disposições da diretiva.
Caso esses parceiros se recusem a fornecer essas garantias, as empresas europeias poderão romper seus relacionamentos comerciais com eles. Uma ilustração notável de um fenômeno semelhante pode ser encontrada na recente controvérsia envolvendo o grupo varejista francês Carrefour, que declarou publicamente sua intenção de deixar de comprar carne de fornecedores brasileiros e de outros países do Mercosul, em resposta a preocupações sobre a sustentabilidade e os direitos humanos em suas cadeias de valor.
Superioridade reconhecida da Diretiva CSDD
O artigo 29(7) da Diretiva CSDD dispõe que “[o]s estados-membros asseguram que as disposições de direito nacional que transpõem o presente artigo sejam de aplicação imperativa nos casos em que a lei aplicável aos pedidos para o efeito não é a lei nacional de um estado-membro”. Esta disposição significa que, em caso de conflito de leis entre a legislação nacional de um estado-membro que implementa a diretiva e a legislação de um terceiro país, a legislação nacional do Estado-membro prevalecerá, mesmo que a legislação estrangeira seja mais favorável ou contenha padrões mais elevados de dever de diligência corporativa.
Nesse sentido, a diretiva afirma sua primazia sobre outros marcos legais, posicionando-se não apenas como o padrão europeu, mas também como um padrão global de dever de diligência. A Comissão Europeia qualificou a diretiva como um passo positivo para apoiar as práticas sustentáveis nos países em desenvolvimento; no entanto, esses países sequer foram consultados durante o processo de elaboração. Essa postura pode ser percebida como sendo condescendente. Ela impõe padrões europeus a jurisdições não europeias, sem considerar seus contextos legais, sociais ou econômicos. Além disso, a UE não tem nenhuma legitimidade para determinar o que é “bom” para os estados não membros.
Efeitos extraterritoriais da diretiva devem ser contidos pelos estados não membros da UE
À luz desses desenvolvimentos, apesar das importantes contribuições e aspectos inovadores incontestáveis da diretiva, ela pode ser vista como uma forma de imperialismo jurídico indelével. O alcance extraterritorial da diretiva representa um desafio significativo para os demais estados, especialmente para os países do Sul Global.
Em novembro de 2023, o Brasil adotou o Decreto 11.772, que estabelece uma Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas. Consultas interministeriais e oitivas com a sociedade civil estão sendo realizados para moldar essa política. No entanto, os efeitos extraterritoriais da Diretiva CSDD ainda não foram totalmente considerados pelas autoridades brasileiras, levantando preocupações sobre o potencial conflito entre a política nacional em construção e o marco europeu._
Mudança na Súmula 70 do TJ-RJ deixa criminalistas céticos, mas Defensoria vê avanço
A alteração do enunciado da Súmula 70 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que permitia a condenação do réu com base apenas em depoimentos de policiais, não deve aumentar a qualidade das ações penais, pois a nova redação é confusa, segundo especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico. Por outro lado, a Defensoria Pública do Rio — autora do pedido de reformulação da tese — acredita que a mudança foi um avanço e gerará decisões mais justas.
Fernando Frazão/ Agência Brasil
TJ-RJ deixou de aceitar condenação só com base na palavra de policiais
O Órgão Especial do TJ-RJ alterou nesta segunda-feira (9/12) o enunciado da súmula, que tinha a seguinte redação: “O fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação”.
Por 13 votos a 1, o colegiado aprovou a proposta de enunciado apresentada pelo desembargador Luiz Zveiter, relator do caso. A Súmula 70 agora tem a seguinte redação: “O fato de a prova oral se restringir a depoimento de autoridades policiais e seus agentes autoriza condenação quando coerentes com as provas dos autos e devidamente fundamentada na sentença”.
Mudou pouco
O advogado e ex-professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Geraldo Prado, hoje investigador integrado ao Instituto Ratio Legis da Universidade Autônoma de Lisboa, não acredita que a nova redação da Súmula 70 melhorará de modo significativo a qualidade dos processos penais e das sentenças.
“A rigor, mudou pouco. Do ponto de vista da prova penal haverá algum ganho, por exemplo, nos casos de flagrante delito, se a convicção judicial vier apoiada em gravações produzidas pelas câmeras que os policiais estiverem usando. E é pelo uso das câmeras que o bom policial estará protegido e as violências policiais poderão ser coibidas. Ainda assim, um conjunto probatório depende de investigação que se qualifica pela coleta de múltiplos elementos que devem ser coerentes e harmônicos entre si.”
Segundo Prado, o problema do enviesamento dos depoimentos dos policiais não é corrigido pela motivação da sentença, mas pela harmonia dessa prova com outros elementos probatórios, sem hierarquia entre eles.
“Qualquer prova condenatória deverá estar em harmonia com outras provas. Não faz sentido especificar uma delas — ‘o depoimento de agentes policiais’ —, salvo se o que se pretende é conferir a essa prova, a priori, maior peso, o que não é correto teoricamente. O melhor teria sido revogar a súmula e editar outra, coerente com posições do Supremo Tribunal Federal, exigindo o uso de câmeras nas abordagens policiais”, opina o processualista penal.
A nova redação da Súmula 70 “não é muito clara”, avalia o advogado Diogo Malan, professor de Direito Processual Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da UFRJ.
“Uma interpretação possível é a de que foi criado regime jurídico de prova legal negativa: depoimentos policiais precisam ser corroborados por provas de outra natureza (à semelhança do que ocorre com o testemunho do colaborador premiado). É preciso aguardar a jurisprudência do TJ-RJ baseada nessa nova redação”, destaca Malan.
Defensoria comemora
A Defensoria Pública do Rio pediu, em 2018, o cancelamento ou, subsidiariamente, a revisão da norma ao Centro de Estudos e Debates do TJ-RJ. O então defensor público-geral do Rio, André Luís Machado de Castro, citou a análise de 1.250 acórdãos publicados entre 2013 e 2016, feita pela Coordenação de Defesa Criminal do órgão. O estudo apontou que magistrados vinham interpretando a Súmula 70 no sentido de presumir a veracidade dos depoimentos de policiais.
O defensor público-geral destacou que a normativa não tinha sido seguida por outros Tribunais de Justiça, e ressaltou que a jurisprudência do STF e do STJ considera que os depoimentos de policiais têm o mesmo valor probatório dos de outras testemunhas. Da forma como vinha sendo aplicada, disse Castro, a Súmula 70 “representava a completa subversão do sistema acusatório”, porque “deslocava o ônus probatório para a defesa, eximindo a acusação de produzir a prova daquilo que verte na denúncia”.
A decisão, embora não alcance o pedido de cancelamento, é um avanço na busca por julgamentos mais justos e fundamentados, avalia a Defensoria. Para a coordenadora de Defesa Criminal do órgão, Lúcia Helena de Oliveira, a alteração do texto é um marco significativo.
“A Súmula 70 tem 21 anos, e há duas décadas lutamos por um novo horizonte nesse tema. Embora o pedido inicial fosse pelo cancelamento, conseguimos um avanço. Temos um marco que deverá ter como consequência uma mudança de cultura nos julgamentos. Nesse sentido, vamos precisar monitorar os julgamentos para garantir que nossos assistidos tenham decisões mais justas, e que essas decisões observem todo o conjunto probatório e, também, os avanços tecnológicos. E, caso os resultados não sejam satisfatórios, seguiremos pleiteando os direitos de nossos assistidos”, diz Lúcia Helena.
O coordenador do Núcleo de Investigação Defensiva da Defensoria, Denis Sampaio, também afirma que a súmula original era um retrocesso em matéria de Direito Probatório.
“A nova redação exige que condenações baseadas em depoimentos de policiais estejam coerentes com as provas dos autos, com o fundamento expresso da coerência nas decisões. Podemos considerar um avanço, na medida em que o juiz deverá realizar um confronto entre as provas produzidas, no que tange à comprovação da autoria, mas precisamos monitorar os impactos práticos nas futuras decisões judiciais.”
Impacto nos julgamentos
Em parceria com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), a Defensoria fez um estudo sobre os impactos da Súmula 70 no julgamento de processos criminais. A pesquisa analisou dados entre 2019 e 2023, com foco em casos de tráfico de drogas julgados pelo TJ-RJ.
O levantamento revelou que, nos processos analisados em que houve aplicação da Súmula 70, 88,76% dos condenados eram do sexo masculino e negros. Esses números ilustram como a aplicação da Súmula 70 contribui para reproduzir desigualdades raciais, especialmente no contexto de delitos relacionados à Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), apontaram a Defensoria e o Geni-UFF.
Parecer de professores
Permitir a condenação com base apenas em depoimentos de policiais, como faz a Súmula 70 do TJ-RJ, distorce o processo penal, legitima abusos das forças de segurança e amplia a seletividade do sistema criminal, contribuindo para o encarceramento de negros e pobres.
Foi o que afirmaram Salo de Carvalho, professor de Direito Penal da UFRJ e da Uerj, e Mariana de Assis Brasil e Weigert, professora de Criminologia do programa de pós-graduação da Universidade Estácio de Sá.
Em parecer encomendado pelo Centro de Estudos Jurídicos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, eles opinaram pelo cancelamento da norma. Os dois apontaram que o depoimento policial é “um dos pilares de sustentação das sentenças criminais condenatórias, especialmente nos delitos patrimoniais e nos ilícitos relacionados com o Direito Penal das drogas”.
A Súmula 70, destacaram eles, baseia-se na presunção de regularidade da atividade policial e das suas manifestações nos procedimentos administrativos e judiciais apuratórios de crimes. “Em razão do cargo, os agentes do Estado estariam resguardados pela fé pública e os seus depoimentos somente poderiam ser refutados se apresentadas provas que evidenciassem má-fé.” Porém, na América Latina, a regra é a violação, por ação ou omissão, da legalidade por parte de agentes dos sistemas punitivos, ressaltaram os professores.
Ao mesmo tempo em que os depoimentos de policiais recebem credibilidade exagerada, os de acusados, especialmente negros e pobres, são desvalorizados, fazendo com que eles sofram “injustiça epistêmica”, avaliaram os pareceristas. A injustiça epistêmica ocorre quando um ouvinte, por preconceito, atribui a um falante um nível de credibilidade que não corresponde às evidências de que ele esteja falando a verdade, conforme conceito formulado pela filósofa Miranda Fricker.
Decisões do STJ
O STJ vem consolidando o entendimento de que condenações criminais não podem ser exclusivamente fundamentadas em depoimentos de policiais.
Por avaliar que houve violação do direito ao silêncio e uma série de injustiças decorrentes da origem social do acusado, a 6ª Turma da corte superior absolveu, em junho de 2023, um jovem que foi condenado por tráfico de drogas apenas com base no depoimento de policiais que fizeram a prisão em flagrante (Recurso Especial 2.037.491)._
Causar acidente de trânsito fatal e fugir é homicídio doloso, diz juiz
Fugir do local de um acidente de trânsito fatal sem prestar socorro caracteriza homicídio doloso e gera pena de reclusão fechada. Com esse entendimento, o juiz Alexandre Sormani, da 1ª Vara Federal de Marília (SP), condenou dois homens por homicídio doloso qualificado e contrabando em razão do envolvimento em um acidente de trânsito ocorrido em agosto de 2017, que resultou na morte de uma mulher e lesões em seu marido.
Freepikcarro após batida
Homem que fugiu após causar acidente de trânsito fatal foi condenado por homicídio
O réu colidiu com o carro do casal e invadiu um estabelecimento comercial. Depois disso, ele abandonou o carro. A polícia encontrou o veículo, que tinha uma carga de cigarros contrabandeados. Com essa informação, o réu ficou entre os suspeitos. A investigação chegou até ele graças ao seu material genético encontrado no airbag do veículo.
O outro réu fazia a escolta da carga. Ele também foi condenado, mas não teve envolvimento direto no acidente, porque estava em outro veículo.
O réu que causou o acidente recebeu a pena de 18 anos e 15 dias de reclusão em regime inicial fechado. O batedor da carga foi condenado a 2 anos e 3 meses de reclusão em regime inicial semiaberto.
O motorista que causou o acidente confessou ser o condutor do veículo durante o interrogatório em plenário. O outro réu admitiu ter atuado como batedor de carga de cigarros contrabandeados. Diante disso, eles receberam os atenuantes de pena previstos no Código Penal. O magistrado também determinou a execução imediata das prisões.
“Levando-se em conta a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, o Supremo Tribunal Federal compreende que é possível a execução imediata da pena privativa de liberdade, independente do trânsito em julgado, pois não haverá possibilidade de revisão recursal quanto ao mérito julgado pelo Conselho de Sentença, eis que as Cortes somente poderão analisar questões acessórias à condenação, questões essas que sejam atribuídas ao Juiz Presidente. Nessa linha de ideias, estabeleceu-se o seguinte precedente: ‘A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada.’ (Tema 1068 STF)”, escreveu o juiz._
Supressão do artigo 19 terceiriza culpa por conteúdos criminosos
No julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal, sobre a ampliação da responsabilidade das chamadas “redes sociais”, falta um personagem na história. O debate se concentra em quem indexa ou reproduz conteúdo — o que abstrai ou minimiza a culpa dos caluniadores e autores das ofensas.
A mera exclusão do artigo 19 do Marco Civil da Internet não mata o mal na raiz. Pior: terceiriza a responsabilidade que deve ser, principalmente, de quem dá causa aos crimes. O principal alvo, em caso de ofensas a direitos, é o seu autor — que deve ser chamado à lide. Afinal, se o conteúdo ilícito é suprimido na origem, não haverá como indexá-lo.
Evidente que, em casos óbvios que se relacionem a delitos gravíssimos, como pedofilia, atentados contra a democracia, racismo, tráfico de drogas e conexos, a própria plataforma deve providenciar a supressão. Mas, para casos menos evidentes, o juiz é o agente adequado para decidir.
FreepikDebate se concentra em quem indexa ou reproduz conteúdo — o que abstrai ou minimiza a culpa dos caluniadores e autores das ofensas
Debate se concentra em quem indexa ou reproduz conteúdo — o que abstrai ou minimiza a culpa dos caluniadores e autores das ofensas
Caso contrário, se delegará a empresas privadas funções de Estado. E cabe ao Estado reprimir e punir com rigor os detratores que, não raro, ofendem, desmoralizam e achincalham pessoas por encomenda. Ou seja: por dinheiro.
Culpados absolvidos
São diversas as situações em que autores de calúnias, injúrias e difamações são eximidos de responsabilidade. O maior lote de notícias fraudulentas da história do Brasil se deu nos anos áureos do esquema que se apelidou de “lava jato”.
Esse caso é paradigmático para dar contexto ao julgamento no STF. Agentes públicos, como delegados, procuradores e juízes, deflagraram uma campanha sem quartel contra empresas, empresários e ministros do STF.
Com a cumplicidade da imprensa, montou-se uma agência de notícias falsas. Empresas foram à falência. Os ministros passaram a ser perseguidos e ameaçados. O mutirão criminoso emparedou o STF para sustentar o falso movimento de “combate à corrupção”.
Ao final, viu-se que o verdadeiro objetivo do esquema não era identificar culpados e levá-los a condenações. Tratava-se de um projeto de poder. Foram as engrenagens dessa grande agência de publicidade que levaram ao Planalto e ao Congresso uma leva de oportunistas.
Responsabilizar quem indexou esse tipo de conteúdo tem dois efeitos: condena o autor errado e absolve os malfeitores — o que acaba por estimular a repetição dos delitos, que já são fabricados em escala industrial.
Os direitos fundamentais são cláusulas pétreas e as redes devem investir um pouco do que ganham no zelo quanto ao que difunde. Mas isso não tira dos ombros do espaço de origem a sua culpa.
O voto do ministro Dias Toffoli segue a clara estratégia de radicalizar o raciocínio para jogar luzes no debate e propiciar reflexão que leve ao caminho do meio. Atenuar a prepotência das empresas que estão perto de governar o planeta. Há um oceano de exemplos de abusos a exigir regras.
Gol contra
A atribuição de responsabilidade por meio do sistema judicial é sempre necessária para casos mais complexos — aspecto em que o artigo 19 é inatacável. Mas há situações nebulosas em que delegar a uma plataforma a incumbência de juiz ou polícia não atende o interesse público.
Outro exemplo de situação foi a Resolução 23.732 do Tribunal Superior Eleitoral. Feita às pressas e sem exame de impacto, estabeleceu que entrevistas que mencionassem projetos de leis configuram propaganda eleitoral.
Para proteger-se, o Google seguiu a regra de forma literal e vetou a difusão, por sua via paga, de entrevistas que mencionassem, por exemplo, a reforma tributária.
Mesmo colidindo com o interesse público, configurou-se situação exemplar de caso em que a delegação do ato de “julgar” às plataformas mostrou-se nociva.
Novamente: não foi a plataforma que deu causa ao mal-entendido e só deve responder subsidiariamente — e não em primeiro lugar, caso haja ofensa a direito. O primeiro a ser acionado deverá ser sempre o autor dos crimes contra honra ou o que se assemelhe.
O debate ganhará mais sentido se houver mais empenho na identificação e punição (exemplar) dos criminosos que, muitas vezes por dinheiro, destroem reputações e colocam as vidas de inocentes em perigo._
Advogado predatório responde junto de cliente por ligitância de má-fé, decide juiz
O advogado deve assumir solidariamente o ônus da condenação de um cliente por ligitância de má-fé na circunstância em que houver indícios concretos de que ele atuou de maneira predatória.
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Advogado condenado protocolou petições idênticas ao ajuizar ações contra o banco
Com esse entendimento, o juiz Luiz Antônio Campos Júnior, da 1ª Vara Cível de Jundiaí (SP), condenou um advogado, junto de uma cliente, a indenizar um banco. Ele ainda ordenou que os autos sejam remetidos ao Tribunal de Ética e Disciplina da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, para apurar a conduta do causídico.
A cliente ajuizou uma ação contra o banco alegando que teria passado a sofrer descontos indevidos na aposentadoria, após a contratação não requisitada de um cartão de crédito consignado, com juros abusivos.
A instituição financeira provou, no entanto, que a contratação foi consentida pela cliente mediante contrato com condições claras. O cartão vinha sendo utilizado por ela e operava com taxas de juros adequadas.
Advocacia predatória
O banco destacou que o mesmo advogado autor da ação havia ajuizado várias outras semelhantes nos meses anteriores. O juiz da causa reconheceu ter identificado mais de mil no site do Tribunal de Justiça de São Paulo, com petições padrozinadas e informações genéricas, sem consideração das especificidades de cada caso.
“A prática é favorecida pela captação de clientes dotados de algum grau de vulnerabilidade, os quais podem ou não deter conhecimento acerca do ingresso da ação, e pelo uso de fraude, falsificação ou manipulação de documentos e omissão de informações relevantes, com nítido intento de obstaculizar o exercício do direito de defesa e potencializar os pleitos indenizatórios”, escreveu o magistrado, ao descrever o modus operandi do advogado.
O juiz registrou, ainda, que, das várias ações ajuizadas, o advogado obtém ganhos em uma ou outra em decorrência de revelia ou de deficiência na atuação defensiva. “Entre as derrotas e vitórias, os advogados predadores sustentam a atividade inescrupulosa, fazendo da atuação ilegítima um verdadeiro meio de vida e de enriquecimento rápido.”
Em razão disso, o advogado e a cliente terão de indenizar o banco em 20% sobre o valor da causa. O magistrado também determinou o envio da sentença ao Núcleo de Prevenção e Mediação de Conflitos (Nupomede), do TJ-SP, a fim de que sejam identificadas demandas idênticas e as implicações delas no Judiciário._
No caso do TikTok, corte dos EUA decide que a segurança nacional se sobrepõe à liberdade de expressão
Na decisão que manteve intacta a lei que colocou o TikTok em uma situação de “ou dá ou desce” — isto é, ou vende a plataforma a investidores não chineses ou é banida dos EUA —, o Tribunal Federal de Recursos no Distrito de Colúmbia se fundamentou essencialmente na tese de que a segurança nacional se sobrepõe à liberdade de expressão.
Essa foi a principal alegação do Departamento de Justiça (DOJ): a de que o governo dos EUA tem a autoridade para banir o TikTok em face do risco que oferece à segurança nacional. Segundo o DOJ, a ByteDance, empresa controladora do TikTok, pode ser pressionada pelo governo da China a expor dados dos usuários americanos ou influenciar o que eles vão ver na plataforma.
O DOJ alegou também que o fato de a rede social ser de propriedade de uma empresa estrangeira exclui seu direito à liberdade de expressão garantida pela Primeira Emenda da Constituição. E que o caso apresentado contra o TikTok não envolve essa questão.
Anatoliy Sizov/istock
EUA alegam que TikTok é o único aplicativo controlado por uma nação estrangeira adversária
Os advogados do TikTok apresentaram três argumentos. Um de que a “Lei de Proteção aos americanos contra aplicativos controlados por adversários estrangeiros” (Protecting Americans from Foreign Adversary Controlled Applications Act), promulgada em abril, viola a liberdade de expressão de 170 milhões de usuários.
Outro argumento foi o de que o TikTok instalou um firewall que impede a ByteDance de acessar os dados dos usuários no país. Chamada de “Projeto Texas”, essa iniciativa de segurança roteia todos os dados dos usuários para um ambiente de nuvem da Oracle, em Austin, capital do Texas. Além disso, nenhuma autoridade dos EUA ofereceu, até agora, qualquer prova de que os chineses tenham tido acesso a esses dados.
O terceiro argumento é o de que o governo americano está atacando apenas um canal de mídia social, o TikTok, entre todos os que estão disponíveis no mercado. Segundo os advogados, isso configura um caso de discriminação entre mídias e usuários, e caracteriza, portanto, uma violação da 5ª Emenda, que garante igualdade perante a lei.
O colegiado de três juízes do tribunal federal de recursos (dois conservadores e um liberal) rejeitou a alegação do DOJ de que o caso não envolve a questão da liberdade de expressão. Porém, “há precedentes jurídicos sustentando que preocupações com a segurança nacional neutralizam considerações sobre liberdade de expressão”.
O juiz liberal destacou, em voto separado, que, “se o caso envolvesse apenas uma empresa doméstica, haveria sérias preocupações sobre a Primeira Emenda”. A decisão unânime dos três juízes, porém, apresentou uma visão peculiar: “Nesse caso, o governo agiu somente para proteger essa liberdade contra uma nação estrangeira adversária”.
Em nome da segurança nacional
Para o tribunal, “o governo ofereceu duas justificativas para agir em nome da segurança nacional: 1) Se opor aos esforços da República Popular da China (RPC) de coletar grandes quantidades de dados de dezenas de milhões de americanos; 2) Limitar a capacidade da RPC de manipular conteúdo secretamente na plataforma do TikTok”.
“A primeira justificativa não se refere ao conteúdo da expressão ou reflete discordância com uma ideia ou mensagem”, diz a corte. “No entanto, a explicação do governo sobre a segunda justificativa se refere ao conteúdo da expressão do TikTok. O governo invoca, especialmente, o risco de a RPC manipular o conteúdo que o usuário americano recebe, interferir em nosso discurso político e promover conteúdo alinhado com os interesses da RPC.”
“De fato, o governo identifica um tema específico — a relação de Taiwan com a RPC — como um potencial ponto de conflito significativo, que pode ser objeto das operações de influência da RPC, e identifica outros tópicos de importância para a RPC”, diz a decisão.
A corte declarou, ainda, que, no julgamento do mérito, rejeita as alegações dos peticionários de violação de dispositivos constitucionais. A lei não viola a Primeira Emenda, que garante a liberdade de expressão, nem a Quinta Emenda, que garante a igualdade perante a lei.
A menção da Quinta Emenda se deve ao fato de o governo atacar apenas o TikTok, entre todas as plataformas de mídia social que operam no país. A justificativa, segundo a corte, é a de que “o TikTok é, até agora, a única plataforma de sua espécie a ser designada pelos poderes políticos como um aplicativo controlado por uma nação estrangeira adversária”.
“Por isso e pela ameaça à segurança nacional, não é surpresa que o Congresso tenha decidido impor restrições somente ao TikTok. Concluímos que a lei é consistente com as exigências de igualdade perante a lei”, declaram os juízes.
Próximos eventos
Apesar da decisão contundente do colegiado do tribunal federal de recursos, muita água deve ainda passar debaixo da ponte. O TikTok poderá, em primeiro lugar, recorrer ao tribunal pleno da corte. Essa será uma iniciativa que não lhe dá muita esperança de sucesso, porque a decisão foi unânime e “bipartidária”. Mas tomará tempo. E levará o caso para além — ou para perto — da data de 19 de janeiro, quando termina o prazo para o TikTok desinvestir. Nesse caso, o presidente poderá estender o prazo em 90 dias.
Perdida a causa, o TikTok vai recorrer à Suprema Corte, com maior esperança de sucesso, segundo o porta-voz da plataforma, Michael Hughes: “A Suprema Corte tem um registro histórico estabelecido de proteger o direito à liberdade de expressão e esperamos que vá fazer exatamente isso ao julgar essa importante causa constitucional”.
Nesse meio tempo, o TikTok espera que o presidente eleito Donald Trump cumpra a promessa de campanha de salvar a plataforma. Em seu primeiro mandato, Trump liderou as tentativas de banir o TikTok, mas ele concluiu que a Meta, dona do Facebook, Instagram, etc. (e principal beneficiária da derrocada do TikTok), contribuiu para sua derrota nas eleições de 2020. E mudou de ideia.
Agora, se especula sobre três possibilidades: 1) Trump poderá persuadir o Congresso, que estará nas mãos do Partido Republicano, a revogar a lei; 2) poderá ordenar a seu novo procurador-geral que não execute a lei; 3) poderá declarar que a ByteDance satisfez a lei, por ter realizado um “desinvestimento qualificado” do TikTok.
Mas, recentemente, tal promessa pareceu abalada, depois que Trump recebeu o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, para um jantar em sua residência oficial no clube de Mar-a-Lago, em Palm Beach, na Flórida.
Aplicação da Selic a dívidas civis anteriores à nova lei é contestada
A Lei 14.905/2024 definiu que, quando a taxa de juros moratórios (aplicados por atrasos em pagamentos) não estiver prevista no contrato, a correção de dívidas civis deve ser feita pela aplicação da Selic menos o IPCA (ou outro índice previsto em eventual lei específica). Mas a norma só vale a partir de agosto deste ano. Diante do julgamento de março, em que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu apenas a Selic como taxa de correção, a possibilidade de rediscussão de casos anteriores a isso gera dúvidas e contestações.
FreepikMulher manuseando calculadora
Pedido de modulação de decisão esvaziada pela lei busca evitar aplicação da Selic a dívidas já corrigidas
Ao alterar o Código Civil e padronizar a fórmula de correção das dívidas civis, a Lei 14.905/2024 esvaziou a tese da Corte Especial do STJ para casos futuros. Mas, no final de outubro, representada pelo escritório Leonardo Amarante Advogados Associados, a autora da ação levada ao colegiado pediu a modulação dos efeitos da decisão, para impedir sua aplicação aos casos em que já houve atualização monetária ou levantamento de valores.
A banca argumenta que a coisa julgada deve ser respeitada. Por outro lado, há quem entenda que a modulação seria injusta e que a revisão dos valores desses casos deve acontecer. Outra corrente considera que a modulação sequer é possível, devido à falta de mudança na jurisprudência do STJ.
Modulação
Em embargos de declaração, a autora e o escritório alegam que a Corte Especial não tratou dos efeitos de sua decisão quanto às ações nas quais já foi definida a forma de atualização monetária do débito ou já houve levantamento dos valores. “A depender da modulação a ser prestada, poderá haver complicado cenário de devolução de montantes legalmente recebidos por força de título executivo judicial, violando-se a coisa julgada”, diz a petição.
Dentre outras coisas, eles pedem que o colegiado preserve o que já foi decidido de forma definitiva nesses casos antes da nova lei e todos os pagamentos já efetuados (ainda que sem trânsito em julgado), mesmo que isso contrarie a decisão de março.“Do contrário, haverá verdadeiro caos no Poder Judiciário, com o reexame de matéria já decidida (e protegida pela coisa julgada) em milhões de processos no país inteiro, violando-se uma série de normas e princípios constitucionais”, assinalam.
De acordo com o advogado Thiago de Mello Almada Rubbo, que atua com contencioso cível no GHBP Advogados, sem a modulação, ações rescisórias podem levar à devolução, anos depois, de parte dos valores já levantados, já que a aplicação da Selic garantiria um montante menor.
A ideia é que os devedores podem ser, em tese, beneficiados com o cálculo por meio da Selic. Isso pode estimular um aumento de ações com o objetivo de aplicar tal taxa, indica Rubbo.
Um dos principais argumentos dos embargos é que tribunais de todo o país não corrigiam dívidas civis pela Selic. A alternativa mais comum era impor juros de 1% ao mês, mais correção monetária por algum índice à escolha da corte (entre IPCA, IGP-M, INPC e outros).
O escritório apresentou à Corte Especial diversos precedentes recentes de, pelo menos, nove tribunais estaduais que aplicaram essa lógica. No julgamento de março, o ministro Luis Felipe Salomão, que foi divergência vencida, apontou precedentes do próprio STJ neste sentido.
“Demonstrou-se que parte considerável dos magistrados de todo o país — a maioria, certamente — costumava aplicar índice diverso àquele definido por força do julgamento deste REsp, de modo que é certo que há uma enormidade de casos concretos em que a taxa Selic não foi adotada”, diz outro trecho da petição dos embargos.
“A coisa julgada tem que ser preservada. Se não, vai haver uma avalanche de processos”, diz o advogado Leonardo Amarante, que assina a petição. Segundo ele, se a modulação não for feita, “todo mundo vai fazer uma ação rescisória”, nos casos em que ainda não tenha se encerrado o prazo legal de dois anos a partir do trânsito em julgado.
Amarante explica que o pedido de modulação busca solucionar situações consolidadas, mas que ainda estão dentro do prazo de ação rescisória; execuções em cumprimento de sentença em andamento, com determinação de aplicação de juros de 1% mais correção monetária; e casos em que a sentença com trânsito em julgado não foi clara em relação ao índice aplicável e deixou dúvidas. Ainda segundo ele, muitas partes e advogados estão aguardando uma definição quanto a essa possível modulação para prosseguirem com acordos nesses casos.
Rubbo acrescenta que muitas questões ainda não foram respondidas, mesmo com a nova lei, “especialmente sobre a aplicação da taxa em casos em que os juros de mora têm incidência em data anterior ao termo inicial da correção monetária”.
Movimento natural
O advogado civilista Sérgio Niemeyer concorda que a decisão da Corte Especial vai causar “um certo afluxo” de ações rescisórias. Mas ele acredita que isso deve acontecer para trazer estabilidade. Niemeyer considera que as partes têm mesmo de pedir as “revisões necessárias” dos juros cobrados e pagos. “Quem pode fazer ação rescisória faz. Quem pode fazer ação anulatória faz. Quem estiver em fase de execução já pede a revisão”, aponta.
Ele ressalta que, segundo precedentes de turmas do STJ (AREsp 1.598.962 e REsp 2.004.691, por exemplo), juros moratórios não estão sujeitos “nem à preclusão nem à coisa julgada”. Ou seja, eles podem ser revistos pelo magistrado de ofício, até mesmo na fase de execução.
O advogado não vê motivos para a modulação. Ele lembra que o caso julgado pela Corte Especial é de 2014. Assim, a modulação esbarraria “em uma dificuldade de ordem racional”: a Selic se aplicaria a este processo, mas não a outras ações propostas na mesma época, ou mesmo depois, e já julgadas.
“Pessoas na mesma situação de fato e de direito não poderiam ter a revisão das suas contas”, pontuou. Ou seja, as partes desses processos não poderiam revisar os valores estipulados, somente porque seu julgamento foi mais rápido.
Na visão de Niemeyer, isso é injusto, até porque a demora na ação de 2014 pode ter ocorrido justamente devido à discussão na Corte Especial.
Obstáculos
Conforme o Código de Processo Civil, a modulação dos efeitos de uma decisão pode ocorrer somente em julgamentos de casos repetitivos ou na hipótese de alteração da jurisprudência dominante dos tribunais superiores.
A advogada Maricí Giannico, sócia do Mattos Filho que atua com contencioso cível, lembra que o julgamento de março da Corte Especial não é repetitivo. Por isso, “não tem eficácia vinculante”. De acordo com Giannico, os embargos partem do pressuposto de que o colegiado precisa dar uma orientação temporal ao tema — o que, para ela, não é necessário em um julgamento não repetitivo.
Niemeyer acredita que o assunto será julgado como repetitivo quando começarem a ser propostas as ações de revisão. Aí, sim, na sua visão, será necessário consolidar a tese.
Amarante defende que “efetivamente ocorreu” em março deste ano uma “alteração do entendimento jurisprudencial dominante” do STJ, o que autorizaria a modulação. Ele ainda ressalta que o caso “influenciará milhões de causas cíveis”, pois, uma vez submetido ao exame da Corte Especial, vincula as turmas do STJ e todos os tribunais brasileiros.
Mas há quem não veja o julgamento de março como uma inovação no tema da atualização das dívidas civis. Segundo essa corrente, a decisão é apenas uma reafirmação do posicionamento histórico do STJ. Isso porque a Corte Especial passou a adotar a Selic em 2008 (EREsp 727.842). Essa decisão foi seguida em diversos outros julgamentos posteriores.
Rubbo destaca que, desde 2015, o CPC prevê “a obrigatoriedade de se observar a tese jurídica definida pelo Plenário ou Órgão Especial dos tribunais superiores”. Ou seja, em tese, “a taxa Selic já deveria ter sido observada”.
Maria Cristine Lindoso, advogada associada da área de tribunais superiores do Trench Rossi Watanabe, lembra que, em um julgamento de recurso repetitivo em 2010 (REsp 1.111.117), a Corte Especial já confirmou a Selic como a taxa de correção das dívidas civis.
“Quer dizer que, desde 2010, os litigantes que pedem a aplicação da taxa Selic costumam ter êxito perante o STJ”, discorre. “Assim, não faria muito sentido discutir a modulação de efeitos para evitar demandas novas se a questão já é passível de debate há anos.” Giannico concorda e ressalta que esse precedente é vinculante.
“Há algum tempo, o STJ vem decidindo que a taxa referencial Selic é a taxa que deve ser aplicada nos débitos fiscais”, complementa Niemeyer. “E não faz sentido que não seja também nas obrigações civis. Então, o tribunal não mudou drasticamente nenhuma jurisprudência.”
Segundo ele, os “advogados atentos” já deveriam saber dessa orientação do STJ. “Quem não discutiu isso não fez por conveniência. Agora, vai poder fazer a revisão, ou vai sofrer a consequência de não ter feito”.
Por outro lado, Giannico não vê possibilidade de rediscussão de valores já corrigidos. Diferentemente do advogado, ela cita precedentes de turmas do STJ contrários à modificação da taxa de juros moratórios na fase de execução — como o AREsp 2.173.347, no qual a 4ª Turma considerou que isso viola a coisa julgada._
Pedido informal de dados do Coaf viola direitos e jurisprudência de STF e STJ
As comunicações entre o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e integrantes do Ministério Público ou da polícia só podem ser feitas por meios formais, conforme determina a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
Mesmo assim, a troca informal de dados entre órgãos continua frequente, o que viola direitos dos cidadãos e diminui a qualidade das investigações, segundo especialistas no assunto ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.
Em depoimento prestado a senadores na Comissão Parlamentar de Inquérito das Bets, em 26 de novembro, o delegado de Polícia Civil do Distrito Federal Erik Salum explicou que, em grandes investigações, autoridades policiais falam diretamente com servidores do Coaf.
“O Coaf gera o relatório de inteligência financeira (RIF) automaticamente se tiver até 800 comunicações. Se tiver acima de 800 comunicações, o sistema automático trava, de tanta comunicação que é. Aí o delegado precisa ligar (para o Coaf) e falar: ‘Olha, me dá uma ajuda aqui, me direciona, para eu tentar selecionar o que você quer’.”
Comunicação ilegal
Os especialistas ouvidos pela ConJur dizem que esse tipo de comunicação direta entre delegado e analista do Coaf é ilegal. O criminalista Pierpaolo Cruz Bottini, professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP), ressalta que o Plenário do STF já deixou claro que qualquer comunicação entre autoridades e Coaf deve ser formal e pelos meios institucionais existentes (Recurso Extraordinário 1.055.941). “Os ministros foram taxativos em rechaçar pedidos informais de dados”, disse o advogado.
Na ocasião, o STF aprovou a seguinte tese (Tema 990 de repercussão geral):
1) É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF (Unidade de Inteligência Financeira, nome antigo do Coaf) e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil, que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional;
2) O compartilhamento pela UIF e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.
De acordo com Bottini, é preciso aprovar com urgência um marco legal para o tratamento de dados no campo da segurança pública. “As lacunas que hoje existem geram insegurança para os cidadãos e para as autoridades, que têm dificuldade para definir suas estratégias de atuação diante de regras imprecisas e interpretadas de maneira contraditória pelo Judiciário.”
Os advogados André Callegari e Marília Fontenele, professores de Direito Penal do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), também apontam que não é legítimo o compartilhamento de RIF pelo Coaf com delegados antes da instauração do inquérito, mesmo que já exista procedimento preliminar para apuração de suposto crime. Isso de acordo com jurisprudência recente da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (Recursos em Habeas Corpus 188.838 e 187.335 e Reclamação 70.191).
“Em seu novo posicionamento, o STJ entende que, embora o procedimento prévio de apuração tenha alguma formalidade, ele não preenche — e esse é o ponto nevrálgico — o requisito de investigação formal utilizado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 990 para autorizar o compartilhamento de informações”, destacam Callegari e Marília.
Os criminalistas ressaltam que a regulamentação do uso da notícia de fato, feita pelo Conselho Nacional do Ministério Público por meio da Resolução 147/2017, reforça essa conclusão. A norma estabelece que, ao receber a notícia de fato, o membro do MP pode colher informações preliminares imprescindíveis para deliberar sobre a instauração do procedimento próprio, sendo vedada a expedição de requisições.
“Ora, se o Ministério Público não pode, em notícia de fato, fazer requisições, a autoridade policial, por óbvio, que serve apenas para municiar o titular da ação penal, não poderá requisitar informações ao Coaf”, avaliam os advogados.
Confusão jurisprudencial
Na visão do advogado Alberto Zacharias Toron, professor de Direito Processual Penal da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), as recentes alterações na jurisprudência do Supremo tornaram o cenário da requisição direta de RIF ao Coaf por delegados “uma espécie de festa do caqui”.
“É possível fazer uma verdadeira pescaria — isso que os americanos chamam de fishing expedition — simplesmente prospectando dados. O delegado tem uma suspeita, pede um RIF e a partir daí inicia a investigação. Isso viola direitos básicos do cidadão quanto à sua intimidade. E só poderia ser feito pela via judicial.”
O STF decidiu, em 2019, que o Coaf pode enviar essas informações de ofício. Hoje, a corte está dividida quanto à possibilidade de polícias e Ministério Público fazerem uma requisição dessas informações. A 1ª Turma entende que esse compartilhamento é válido, sem qualquer necessidade de passar por controle prévio do Judiciário. Já a 2ª Turma diz que o envio de informações depende de autorização do juiz competente.
“Ao se estabelecer a possibilidade de o delegado requisitar ou pedir RIF diretamente, adentra-se um campo da informalidade onde tudo é possível, inclusive pesquisar inimigos e autoridades politicamente expostas, como já se tentou fazer no passado. É por isso que eu penso que o Supremo deve rever a sua jurisprudência, na linha do que tem decidido a 2ª Turma”, analisa Toron.
Efeitos da divergência
A divergência entre as turmas do STF reverbera com força no Superior Tribunal de Justiça. A princípio, a corte interpretou o compartilhamento de “RIFs por encomenda”, sem prévia autorização judicial, como ilícito, orientação que já varia por causa do Supremo.
O impacto disso não é baixo. Em dez anos, o Coaf aumentou em 1.339,4% o número de RIFs produzidos por iniciativa das Polícias Civil e Federal e do Ministério Público. Em 2023, o órgão elaborou e entregou uma média de 38 relatórios por dia.
Presidente do Coaf, Ricardo Liáo disse à ConJur que esse embate exige que o Supremo estabeleça quais são os requisitos mínimos, máximos ou básicos a serem observados nas demandas oriundas das autoridades de investigação.
O risco, conforme apontado por especialistas, é que Coaf e Receita se tornem repositórios de informações e permitam a prática de pesca probatória (fishing expedition)._
Juiz condena trabalhador a pagar multa por litigância de má-fé por mentir sobre dispensa
O juiz Jorge Antonio dos Santos Cota, da Vara do Trabalho de Itatiba (SP), decidiu condenar um trabalhador a pagar multa por litigância de má-fé mesmo ele tendo recebido o benefício da Justiça gratuita.
Na ação, o trabalhador pedia o reconhecimento da nulidade de seu pedido de demissão, com reversão para rescisão de contrato sem justa causa, por iniciativa da empresa.
No decorrer do processo, contudo, a empresa conseguiu comprovar que o ex-empregado tinha pedido demissão por ter sido contratado por outra empresa. Ao decidir, o magistrado apontou a improcedência do processo e aplicou multa ao empregado por litigância de má-fé.
Além de mentir sobre a suposta dispensa por justa causa, o ex-funcionário também fez falsas acusações à empresa, além de agir de modo temerário para alterar a verdade dos fatos no decorrer do processo.
“Com arrimo no artigo 791-A, caput e parágrafo 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho, com a redação dada pela ADI número 5766, do Excelso Supremo Tribunal Federal, condeno o(a) Reclamante a pagar ao patrono do (a) Reclamado(a) honorários sucumbenciais arbitrados em 10% (dez por cento) incidente sobre o valor atribuído à causa, ora fixados em R$ 5.534,38 (cinco mil, quinhentos e trinta e quatro reais e trinta e oito centavos)”, registrou ao condenar o trabalhador.
Atuou em favor da empresa o advogado Fernando Molino, sócio do escritório LDG Advogados. _
Novidades na admissibilidade do recurso de revista
Faltando pouco menos de um mês para o recesso forense, uma nova resolução editada pelo Plenário do Tribunal Superior do Trabalho (TST) alterou a sistemática recursal trabalhista com o intuito de evitar que decisões contrárias à jurisprudência vinculativa daquela Corte de Vértice sejam proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs).
Trata-se da Resolução nº 224, de 25 de novembro de 2024 [1], que ao modificar a Instrução Normativa n° 40, de 15 de março de 2016 [2], passou a dispor, de forma inédita, sobre nova hipótese de cabimento de agravo interno em caso de admissibilidades negativas de recursos de revistas pelos TRTs. É importante ressaltar que tais novidades procedimentais trazidas por essa resolução administrativa já passarão a viger para as decisões de admissibilidade recursal publicadas a partir de 28 de dezembro de 2024.
Por certo, considerando que este assunto irá impactar toda a advocacia trabalhista para o ano de 2025, a temática foi indicada por você, leitor(a), para o artigo da semana na coluna Prática Trabalhista desta ConJur [3], razão pela qual agradecemos o contato.
Lição de especialista
De início, quanto à classificação recursal no âmbito do processo do trabalho, oportunos são os ensinamentos do Professor Mauro Schiavi [4]:
“Os recursos extraordinários não se destinam à correção dos erros de procedimento ou de julgamento, tampouco a justiça da decisão. Eles têm por objetivo a uniformização da interpretação da legislação Constitucional e Federal no âmbito da competência da Justiça do Trabalho.
No processo do trabalho, são de natureza extraordinária, os seguintes recursos: recurso de revista (art. 896, da CLT) e o recurso de embargos para o TST (art. 894, da CLT e da Lei 7.701/88).
Embora não seja um recurso trabalhista propriamente dito, o recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (art. 102, III, da CF) tem natureza extraordinária e também se destina a impugnar decisões de única ou de últimas instâncias proferidas pelos Tribunais Trabalhistas.”
Legislação trabalhista
Do ponto de vista normativo, o artigo 893 [5] e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) traz um capítulo específico de recursos, tratando expressamente, dentre outros apelos, do recurso de revista e do agravo de instrumento. Como se sabe, em razão de sua natureza extraordinária, o recurso de revista é demasiadamente técnico, tendo em vista que o principal papel do TST é de buscar a uniformização da jurisprudência trabalhista, de modo que para sua prévia admissibilidade pelos Tribunais Regionais se faz necessária a observância rigorosa de certos pressupostos processuais.
Para tanto, imprescindível o cumprimento de duas etapas: i) o Tribunal Regional local irá verificar se o recurso de revista atende aos pressupostos legais mínimos, para que seja dado seguimento ao apelo, para que haja o seu julgamento pela Corte Superior; e ii) se a Corte local entender que o apelo não apresenta tais pressupostos processuais, o recurso de revista terá então obstado o seu seguimento, de modo que contra essa decisão denegatória tradicionalmente a parte se valia da figura do agravo de instrumento, que é um recurso próprio para o destrancamento em particular da revista.
Dados estatísticos
A propósito, das decisões dos Tribunais Regionais do Trabalho que denegam seguimento aos recursos de revistas, aproximadamente 93,88% são confirmadas pelo Tribunal Superior do Trabalho de acordo com um relatório disponibilizado em outubro de 2023 [6]. Aliás, recentemente, o TST inaugurou a Secretaria de Admissibilidade Recursal, que integra a Secretaria-Geral de Gestão de Processos, visando justamente reduzir o volume de processos por meio do mapeamento de temas que chegam àquele tribunal [7].
Resolução nº 224, de 25 de novembro de 2024
A partir desta nova resolução, no caso de o TRT não admitir (parcial ou totalmente) o recurso de revista, diferentemente do que acontecia até então quando se exigia apenas a interposição do recurso de agravo de instrumento, doravante serão adotadas medidas diversas, nos termos do artigo 1º-A:
“Art. 1°-A Cabe agravo interno da decisão que negar seguimento ao recurso de revista interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, exarado nos regimes de julgamento de recursos repetitivos, de resolução de demandas repetitivas e de assunção de competência, de acordo com os arts. 988, § 5°, 1.030, § 2°, e 1.021 do CPC, aplicáveis ao processo do trabalho, conforme art. 896-B da CLT.
1º Havendo no recurso de revista capítulo distinto que não se submeta à situação prevista no caput deste artigo, constitui ônus da parte impugnar, simultaneamente, mediante agravo de instrumento, a fração da decisão denegatória respectiva, sob pena de preclusão.
2º Na hipótese da interposição simultânea de que trata o parágrafo anterior, o processamento do agravo de instrumento ocorrerá após o julgamento do agravo interno pelo órgão colegiado competente.
3º Caso o agravo interno seja provido, dar-se-á seguimento, na forma da lei, ao recurso de revista quanto ao capítulo objeto da insurgência; na hipótese de o agravo interno ser desprovido, nenhum recurso caberá dessa decisão regional.
4º As reclamações fundadas em usurpação de competência do Tribunal Superior do Trabalho ou desrespeito às suas decisões em casos concretos (CPC, art. 988, I e II) não se submetem ao procedimento estabelecido neste artigo, conforme expressa disposição do § 5º, II, do art. 988 do CPC.
5º As disposições contidas neste artigo aplicam-se às decisões de admissibilidade publicadas a partir do 30º dia após o início de sua vigência, que deverá ocorrer na data da publicação.”
Observe-se que, a partir do dia 28 de dezembro de 2024, se o recurso de revista não for admitido, mas a decisão regional atacada estiver em plena conformidade com a jurisprudência vinculante do TST — representada pelos precedentes proferidos nos julgamentos de incidentes de recursos repetitivos (IRR), de resolução de demandas repetitivas (IRDR) e de assunção de competência (IAC) —, o novo recurso cabível será agora o de agravo interno, cujo julgamento será feito pelo próprio TRT, em órgão colegiado competente que, na ausência de previsão regimental, se entenderá pelo Plenário do TRT.
E após ser proferido julgamento pelo órgão colegiado competente do agravo interno, com a manutenção da decisão de admissibilidade negativa do recurso de revista, nenhuma outra irresignação recursal, em tese, caberá dessa decisão regional, tornando o pronunciamento irrecorrível.
E se fala “em tese”, pois a própria Resolução nº 224/2024 fez questão de excepcionar o uso das reclamações direcionadas ao Tribunal Superior do Trabalho, as quais, por terem natureza de ação, e não de recurso, podem ser manejadas pela parte recorrente, seguindo a sistematização processual prevista no artigo 988 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC), caso persista o desrespeito à aplicação de precedente vinculativo do TST.
Em sentido oposto, para todas as demais hipóteses de admissibilidade negativa do recurso de revista pelos Tribunais Regionais, naturalmente fica mantido o uso do agravo de instrumento, na forma de sua regulamentação já prevista pela Instrução Normativa nº 40 do TST, de 15 de março de 2016.
Mais a mais, outra grande novidade trazida pela Resolução nº 224/2024 é a interposição simultânea de dois recursos de agravos, isto é, a partir do dia 28.12.2024, a depender do conteúdo da decisão denegatória, a parte terá que interpor agravo interno, para a fração em que o parâmetro de confronto seja uma temática inserida no sistema de precedentes vinculativos do TST, e de agravo de instrumento para os demais temas sob pena de preclusão.
Eventual equívoco na interposição dos recursos de agravos (interno e/ou de instrumento), por certo não será tido como erro justificado, não se aplicando aqui o princípio da fungibilidade recursal, conferindo-se inegável prejuízo à parte que não estiver adequadamente representada em juízo por advogado(a) ciente dos respectivos termos da atual resolução administrativa.
E neste novo cenário de interposição simultânea de agravos pela parte, o processamento do agravo de instrumento ocorrerá após o julgamento do agravo interno pelo órgão colegiado competente do TRT (leia-se, o Plenário do Tribunal Regional, salvo de houver futura previsão regimental em sentido oposto), isso para evitar que o processo não seja desmembrado.
De resto, impende destacar que, de acordo com o artigo 22, I, da Constituição [8], a competência privativa para legislar sobre o direito do trabalho é exclusiva da União, e, nesse sentido, a validade da Resolução nº 224, de 25 de novembro de 2024, poderá vir a ser objeto de discussão judicial junto ao Supremo Tribunal federal (STF).
Conclusão
A par do exposto, verifica-se que esta nova sistematização recursal é muito impactante para a advocacia trabalhista que lida diariamente perante os tribunais, lembrando ser praxe que a maioria dos recursos de revistas que chegam no TST, em Brasília, são originários de agravos de instrumentos.
Por isso que, em arremate, tal novidade eminentemente prática é por demais significativa, de sorte que o ano de 2024 se encerra trazendo um imenso desafio para todo o Poder Judiciário Trabalhista que terá, em tempo recorde, que se adaptar internamente para implementar tal metamorfose procedimental, exigindo da advocacia uma imediata atualização profissional.
___________________________________________
[1] Disponível aqui. Acesso em 02.12.2024.
[2]Disponível aqui. Acesso em 02.12.2024.
[3] Se você deseja que algum tema em especial seja objeto de análise pela Coluna Prática Trabalhista da ConJur, entre em contato diretamente com os colunistas e traga sua sugestão para a próxima semana.
[4] Manual de Direito Processual do Trabalho – 17. Ed. ver., atual. e ampl. – Salvador: Editora JusPodivm, 2021. Página 932.
[5] Disponível aqui. Acesso em 03.12.2024.
[6] Disponível aqui. Acesso em 03.12.2023.
[7] Disponível aqui. Acesso em 03.12.2024.
[8] CF, Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho._
Ataque hacker não exclui responsabilidade por proteção de dados, diz STJ
O tratamento de dados pessoais configura-se irregular quando deixa de fornecer a segurança que o titular poderia esperar, consideradas as circunstâncias relevantes do caso.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou que a Enel tem responsabilidade pelo vazamento de dados não sensíveis de uma consumidora, após um ataque hacker.
O consumidor teve exposto nome completo, números de RG e CPF, endereço, endereço de e-mail e telefone. A ação foi ajuizada para cobrar indenização da empresa, que à época se chamava Eletropaulo.
A Enel, por sua vez, apontou que o ataque hacker é ato de terceiro apto a justificar a excludente de responsabilidade, conforme prevista no artigo 43, inciso III da Lei Geral de Proteção de Dados.
Quando analisou o caso, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a responsabilidade da empresa, mas não vislumbrou violação à dignidade humana da consumidora, já que os dados expostos não são sensíveis, mas de fácil acesso.
O TJ-SP afastou a condenação ao pagamento de indenização, mas impôs que a Enel apresentasse informação das entidades com as quais fez uso compartilhado dos dados, fornecendo declaração completa que indique sua origem, registro e critérios.
Responsabilidade existente
Essa obrigação é uma possibilidade que consta do artigo 19, inciso II da LGPD. Ao analisar o caso, o relator do recurso especial, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, decidiu manter as conclusões do tribunal de apelação.
Ele destacou que a Emenda Constitucional 115/2022 elevou a proteção de dados e inaugurou um novo capítulo sobre o tema no ordenamento jurídico brasileiro. Além disso, explicou que a Enel, por se enquadrar na categoria dos agentes de tratamento de dados, tinha a obrigação legal de tomar todas as medidas de segurança esperadas para que as informações fossem protegidas em seus sistemas.
Isso significa atender a requisitos de segurança e padrões de boas práticas e governança, além de princípios gerais previstos na LGPD e nas demais normas complementares. A ocorrência do ataque hacker mostra uma falha da empresa.
“O tratamento de dados pessoais configura-se irregular quando deixa de fornecer a segurança que titular poderia esperar, consideradas circunstâncias relevantes do caso”, apontou. A votação na 3ª Turma foi unânime._
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